Acidente com avião cujo motor se soltou em pouso na água tem relatório emitido, veja como ocorreu

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Avião DHC 6 Twin Otter Trans Maldivian
DHC 6 Twin Otter da Trans Maldivian – Imagem: Walter Schärer / Flickr [CC]

O Comitê Coordenador de Investigação de Acidentes (AICC) das Ilhas Maldivas emitiu um Relatório Preliminar apresentando detalhes e descobertas sobre um acidente ocorrido no dia 24 de fevereiro com um avião bimotor turboélice DHC-6 com passageiros.

Na ocasião, a aeronave DHC 6-300 registrada sob a matrícula 8Q-MBC, de propriedade e operada pela Trans Maldivian Airways (TMA), estava em um voo charter do Aeroporto Internacional de Velana para o Kuredhu Island Resort, ambos nas Maldivas. O voo foi realizado de acordo com as Regras de Voo Visual (VFR).

Havia quinze passageiros, dois pilotos e um tripulante de cabine a bordo da aeronave. O acidente ocorreu durante o pouso no aeródromo aquático do Kuredhu Island Resort. No momento do acidente, o aeródromo estava sujeito a ventos fortes e mar agitado sob condições ensolaradas, comuns durante as monções do nordeste, embora atípicas na época do ano.

A aeronave, enquanto pousava em uma das pistas de água designadas (mas não marcadas), aterrissou e saltou. Após o salto, enquanto a aeronave ainda estava no ar, inclinou-se para a esquerda, mergulhando a ponta da asa esquerda na água e virando-se bruscamente para a esquerda. O motor da asa direita da aeronave soltou-se abruptamente. O Piloto em Comando (Pilot in Command – PIC) relatou que tentou arremeter após o salto, sem sucesso.

Acidente DHC 6 Trans Maldivian
O motor direito do DHC 6 – Imagem: AICC

Durante o acidente, fuselagem, asas, motores e hélices da aeronave sofreram danos substanciais. Ambos os flutuadores estavam intactos e a aeronave permaneceu “em pé” após o evento. A aeronave foi movida e amarrada à baia com a ajuda do motor esquerdo e um barco.

Todos os passageiros e tripulantes conseguiram evacuar com segurança, no entanto, como consequência direta do acidente, dois membros da tripulação e um passageiro sofreram ferimentos leves.

Descobertas da investigação

No dia do acidente, os dois pilotos compareceram às 06:00 na base da TMA. Tanto o PIC quanto o Primeiro-Oficial (FO) estavam no ônibus das 05:10 de HulhuMale, e foi o primeiro dia de volta ao trabalho após três dias de folga. Foi a primeira vez que os dois pilotos estavam escalados para voar juntos.

Não foram feitas apresentações apropriadas da tripulação de voo, nem houve briefings da tripulação antes do voo. O primeiro voo do dia foi Male – Lily Beach – Male e o segundo voo foi Male – InnaHuraa – Atmosphere – Male. O voo do acidente foi o terceiro voo – a sexta etapa do dia.

Todos os voos do dia ocorreram sem intercorrências até o voo do acidente. A tripulação relatou não ter recebido nenhuma atualização meteorológica para Kuredhu (KUR), mas estava ciente de outros voos operando para lá. A empresa emitiu uma “liberação de voo” para os dois setores MLE/KUR e KUR/MLE na noite anterior e não havia registro de existência de defeitos na aeronave.

A tripulação começou o dia preparando a aeronave para o voo. A água foi bombeada para fora dos flutuadores e o número de bombeamentos necessários para esvaziá-los foi registrado no “formulário de relatório de status do flutuador”. Os procedimentos da empresa exigem a verificação do status de manutenção dos flutuadores no início e no final de cada dia.

O co-piloto bombeou o flutuador direito enquanto o tripulante de cabine bombeou o flutuador da esquerda. Segundo a equipe, o número de cursos de bombeamento para esvaziar a água dos flutuadores estava dentro dos limites especificados nos procedimentos da empresa.

A tripulação realizou as verificações de pré-voo e de walk-around antes do primeiro voo do dia. Nenhuma anormalidade foi registrada ou relatada pela tripulação. O voo de ida e volta, Male-Kuredhu-Male, foi lançado com 3 membros da tripulação (2 tripulantes de voo e 1 tripulante de cabine) e 15 passageiros de Male para Kuredhu.

Conforme o documento de liberação do voo, a aeronave foi carregada com 434 libras de bagagem e 785 libras de combustível, com uma massa de decolagem de 12.495,58 libras. O FO foi o piloto a voar a aeronave (Pilot Flying – PF) para este setor do voo.

Durante táxi, decolagem, cruzeiro e até a aproximação de Kuredhu, o voo foi normal e sem intercorrências. A altitude de cruzeiro era de 6500 pés, os ventos eram de leste, e as condições do mar eram consideradas difíceis.

Aproximação e acidente

A descida começou 15 minutos antes do pouso em Kuredhu, e o FO deu as instruções e as verificações de descida. O FO solicitou que o PIC ‘esperasse pela linha’, e quando Kuredhu estava visível, o FO também informou ao PIC que essa seria a “Base direita para o pouso com rumo a nordeste”. O FO relatou ter visto ondas brancas e as águas estavam agitadas, mas estava confiante em aterrissar em águas tão agitadas, como já feito em pousos semelhantes na semana anterior.

O FO comunicou a linha ao PIC e declarou “em caso de arremetida, subiremos a 500 pés conforme o POP”. O PIC aconselhou o FO a manter a aeronave ligeiramente à esquerda, mais perto do recife, apenas na área azul mais clara, pois, acreditava-se que essa área era relativamente mais calma.

O FO relatou que, a cerca de 400 pés, pediu flaps completos e rpm máxima, repetiu pela segunda vez que “em caso de arremetida subiremos a 500 pés conforme o POP” e afirmou que não havia obstrução para o pouso. O PIC confirmou o pouso na região externa da lagoa de recifes e vento de cerca de 10 graus.

O pouso no interior da lagoa parecia ser mais arriscado para o PIC, devido ao número de obstruções, incluindo barcos e boias, e o pouso fora da lagoa era considerado mais seguro. Nenhum sobrevoo em círculo foi realizado uma vez que não havia conscientização das condições ruins de pouso.

Durante a aproximação, a cerca de 100 a 150 pés de altura, o PIC notou que a velocidade estava baixa e instruiu o FO a corrigir a velocidade. O FO respondeu corrigindo a velocidade. O FO relatou notar uma diferença de altura de 20 a 40 pés entre os altímetros, e também uma diferença de 2 a 3 nós nos indicadores de velocidade (Airspeed Indicator – ASI).

A aeronave, durante o pouso, tocou a água e saltou, o que parecia ser administrável, de acordo com a tripulação. Assim que a aeronave voltou ao ar, o FO foi aconselhado pelo PIC a adicionar potência para uma arremetida. Ao mesmo tempo, o FO ouviu o alarme de incêndio. Uma vez que a aeronave saltou, o PIC tentou iniciar uma arremetida, mas a velocidade diminuiu e houve uma queda simultânea da asa esquerda.

Como a potência foi adicionada após o salto, a aeronave se inclinou para a esquerda com a ponta da asa esquerda mergulhando na água e virando a aeronave para a esquerda. O FO tentou nivelar a aeronave, mas relatou controles extremamente pesados.

Imediatamente após a ocorrência, o PIC tentou desligar o motor direito, pois o alarme de incêndio tocava continuamente, mas não conseguiu mover as alavancas de combustível que estavam travadas. Como medida de precaução, ativou subsequentemente as garrafas do extintor de incêndio e, em seguida, desligou as válvulas de corte de combustível e também desligou a bomba de combustível do motor direito.

O PIC instruiu o FO a verificar visualmente se havia um incêndio no motor direito, para o qual o FO confirmou que não havia fogo visível, mas fumaça emanava do motor. O FO prosseguiu com uma verificação externa de danos causados ao flutuador, uma vez que, normalmente, danos aos flutuadores estão associados a pousos duros.

Resgate e evacuação

O FO, depois de buscar a aprovação do PIC, começou a seguir o procedimento de evacuação e, com a assistência do tripulante de cabine, instruiu e ajudou os passageiros a remover os cintos de segurança.

Em seguida, os passageiros foram instruídos a remover os coletes salva-vidas de debaixo dos assentos e a usar os coletes salva-vidas, mas a não inflar os coletes. Os passageiros foram instruídos a esperar pelo barco de resgate.

O FO relatou ter telefonado para o despacho da TMA três ou quatro vezes, relatou um acidente e pediu ajuda. Chegaram um jetski e uma lancha, mas o jetski se recusou a rebocar a aeronave, pois não teria capacidade para rebocá-la. Usando o motor esquerdo operável e controlando a aeronave usando a manete de potência do motor esquerdo, o PIC tentou manter a aeronave estável.

Após cerca de 15 minutos, um barco do resort chegou e ajudou a aeronave a ser levada à baliza de desembarque. Uma vez que a aeronave estava segura, o motor esquerdo foi desligado, os passageiros desembarcaram e a bagagem foi descarregada, após o que a tripulação foi para o resort.

Danos à aeronave

O levantamento pelos investigadores identificou a extensão dos danos causados ​​à estrutura, à asa, aos motores e às hélices.

Os danos incluem, mas não se limitam a:

1. Asa direita:

  • a. Foram observados vários danos na asa na área entre as nervuras 25 a 28;
  • b. A superfície inferior do bordo de ataque das nervuras 26, 27 e 28 foi encontrada dobrada para cima;
  • c. Ponta da asa rasgada em vários lugares;
  • d. Fin da asa deslocado com o bordo de ataque movido para dentro;
  • e. Superfície do flap interno amassada para dentro.

2. Asa esquerda:

  • a. Ponta da asa encontrada danificada;
  • b. Bordo de ataque da ponta da asa amassado e dobrado para baixo e para trás;
  • c. Aileron esquerdo mais externo encontrado torcido e dobrado para cima.

3. Motor direito:

  • a. Motor encontrado totalmente desconectado do suporte/nacele, pendurado apenas pelas mangueiras de combustível e hastes de controle de combustível conectadas a ele;
  • b. Um dos isoladores de vibração (interno) encontrado partido;
  • c. Estrutura de nacele danificada onde os isoladores de vibração (externo e superior) foram arrancados;
  • d. Pás da hélice do motor direito (todas as três) foram encontradas dobradas para trás. Marcas de arranhões de tinta vermelha encontradas em uma das pás;
  • e. Danos observados nas três pás;
  • f. A superfície da capota inferior do motor rompeu-se em vários locais e foram encontrados rebites de fixação partidos.

4. Flutuadores:

  • a. A ponta do flutuador esquerdo foi encontrada danificada.

5. Fuselagem:

  • a. O painel do compartimento hidráulico esquerdo foi encontrado torcido e o canto superior dianteiro dobrado para fora;
  • b. O painel do compartimento hidráulico direito foi encontrado torcido e dobrado para fora a partir do canto inferior traseiro;
  • c. Movimento das manetes de controle parcialmente restrito;
  • d. Controle de combustível do motor direito travado.

Manutenção recente

As inspeções de manutenção mais recentes realizadas incluem: Manutenção Equalizada para Disponibilidade Máxima (EMMA) número 17, cumprida em 29 de janeiro de 2020.

Durante esta inspeção EMMA, o suporte superior do motor foi substituído por uma nova unidade e várias outras tarefas relacionadas ao motor e à hélice foram realizadas.

Controles de voo

Somente as inspeções exigidas na inspeção EMMA foram realizadas nos controles de voo. A equipe de manutenção e operação não relatou anormalidades nos controles de voo.

Motores

Os registros de manutenção confirmam que o motor instalado na posição direita foi substituído em 12 de fevereiro de 2020, como uma solução de problemas em um relatório do piloto (Pirep), que afirmava que o acionamento do reverso levava mais de 8 segundos.

Como exigência simultânea, o balanceamento dinâmico da hélice foi realizado em 16 de fevereiro de 2020. Nenhum defeito foi relatado posteriormente.

Informação meteorológica

Não havia dados meteorológicos disponíveis no aeródromo aquático de Kuredhu.

A Circular de Segurança Aérea da Autoridade de Aviação Civil (ASC14-2 Alteração 1, Procedimento e requisitos para o licenciamento de aeródromos aquáticos e plataformas flutuantes, datada de 04 de fevereiro de 2009) requer que um indicador de direção do vento seja montado na área de movimento. Nenhum auxílio visual estava disponível no aeródromo aquático de Kuredhu no momento do acidente.

As informações meteorológicas disponíveis na estação meteorológica automática na ilha Lhaviyani Olhuvelifushi, localizada 34 km a sudeste do aeródromo aquático de Kuredhu, eram:

  • Pressão: 1011 hectopascais
  • Chuva: 0
  • Velocidade do vento (média): 080° a 15 mph (24 km/h)
  • Velocidade do vento (máximo): 070° a 26 mph (42 km/h)

Gravadores de dados

Os gravadores de dados não são exigidos pelos Regulamentos de Aviação Civil das Maldivas (MCAR). Nenhum gravador de dados de voo (FDR) ou gravador de voz do cockpit (CVR) foi instalado na aeronave, pois os MCAR permitem a operação da aeronave DHC6, série 100/200/300 (legada) sem eles.

Aspectos de sobrevivência

Após a aeronave estabilizada, o copiloto seguiu para a cabine e trabalhou com o tripulante para verificar o bem-estar dos passageiros. Eles se certificaram de que os passageiros vestiam seus coletes salva-vidas, enquanto eles mesmos vestiam seus próprios coletes salva-vidas.

O PIC telefonou para despacho, comunicou aos Despachantes a situação e solicitou que ligassem para Kuredhu para fornecer-lhes um rebocador, para que o estacionamento da aeronave na baia pudesse ser realizado. Um barco do resort ajudou a tripulação a taxiar a aeronave até a baia e a prender a aeronave.

Todos os passageiros foram evacuados com segurança. Todos os assentos e cintos de segurança estavam intactos.

Testes e pesquisas

Como não é comum que os isoladores de vibração do motor se partam como ocorreu, os conjuntos de isoladores de vibração do motor direito do acidente exigem testes de metalurgia para determinar a causa da falha.

Esses isoladores são submetidos a inspeções periódicas de correntes de Foucault, conforme exigido na Diretiva de Aeronavegabilidade Nº CAD/2005/01R1, emitida pela Autoridade de Aviação Civil das Maldivas (MCAA). A Diretiva afirma que a experiência de operações anteriores indicou que as falhas do isolador de vibração do motor ocorrem ocasionalmente durante o pouso em condições de águas adversas.

CONCLUSÕES INICIAIS

Com base nas informações coletadas durante o curso da investigação, os fatos listados abaixo foram determinados:

– A aeronave possuía um certificado de aeronavegabilidade válido;

– A tripulação possuía licenças e qualificações válidas para conduzir o voo;

– A aeronave foi submetida a força anormal durante o pouso;

– Os conjuntos de isoladores de vibração do motor, instalados no motor do lado direito e que falharam durante o pouso, haviam sido submetidos a inspeções por correntes de Foucault, conforme exigido na Diretiva de Aeronavegabilidade da MCAA. O conjunto tinha horas suficientes restantes até a próxima inspeção;

– Conforme o operador, normalmente cartões SD são instalados em todas as aeronaves. No entanto, o cartão SD que normalmente captura os dados operacionais no sistema Garmin G950 não foi encontrado na aeronave;

– As condições climáticas no aeródromo aquático KUR eram desconhecidas antes da partida da aeronave da base principal MLE;

– Fraca coordenação entre o PIC e o FO e erros de julgamento do piloto que voava (PF);

– Não houve briefing antes do voo;

– Circular CAA Air Safety ASC14-2 Alteração 1, Procedimento e requisitos para o licenciamento de aeródromos aquáticos e plataformas flutuantes, datados de 04 de fevereiro de 2009, requer que um indicador de direção do vento seja montado na área de movimento, mas nenhum estava disponível.

RECOMENDAÇÕES DE SEGURANÇA

– Visto que a fratura dos suportes do motor havia ocorrido em várias outras aeronaves DHC6 no passado, recomenda-se que o suporte que falhou seja submetido a um teste metalúrgico juntamente com outros suportes do motor que pertencem ao mesmo lote disponível com o operador;

– Como a aeronave é equipada com o conjunto de aviônicos Garmin G950 sob o devido STC e o sistema é capaz de registrar vários parâmetros normalmente capturados em um FDR (Gravador de Dados de Voo), recomenda-se que a MCAA estabeleça procedimentos para evitar a perda do cartão de dados instalado no painel;

– Note-se que o AICC, em suas recomendações após várias investigações anteriores sobre acidentes, recomendou à MCAA que reexaminasse os critérios para o transporte de gravadores de voo em aeronaves da categoria transporte, certificadas para transportar mais de 9 passageiros, com vista a exigir que toda aeronave tenha pelo menos um CVR. Portanto, recomenda-se que a MCAA considere as recomendações anteriores da AICC.

Informações oficias da MCAA

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Murilo Basseto
Murilo Bassetohttp://aeroin.net
Formado em Engenharia Mecânica e com Pós-Graduação em Engenharia de Manutenção Aeronáutica, possui mais de 6 anos de experiência na área controle técnico de manutenção aeronáutica.

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