Bradesco lança boato de que a Azul pode adquirir a Passaredo. Será?

Na tarde de ontem, o Bradesco BBI divulgou uma nota apontando uma possível compra da Passaredo pela Azul Linhas Aéreas. Será que faz sentido? Em nosso entendimento, não.

Avião ATR-72 Passaredo
ATR-72 da Passaredo

O motivo do interesse, segundo o Bradesco, seria a redistribuição de slots da Avianca Brasil em Congonhas. A regra atual beneficia novas entrantes no aeroporto como a Passaredo, mas não se aplica à Azul, que já opera no aeroporto.

No entanto, a TWOFLEX, que opera alguns Cessna C208 Caravan quer entrar na distribuição. Vale lembrar que não basta querer os slots, a empresa aérea terá que mostrar ter capacidade de utiliza-los e manter a utilização, caso contrário, ela os perde. Foi o que aconteceu com a Avianca Brasil.

No caso de uma redistribuição que valorize as novas entrantes, a Passaredo poderia conseguir um bom número de slots e, por consequência, ser atrativa para a Azul ou outra empresa aérea estrangeira. Mas, quando o Bradesco afirma que Azul estaria interessada e que poderia dobrar sua capacidade, entendemos que é uma análise rasa, veja o por quê.

Essa semana, a Passaredo comunicou o mercado que está expandido operações na Bahia, aproveitando-se da baixa do ICMS do Estado, porém não está adquirindo novas aeronaves. assim, a frota continuará restrita aos cinco turboélice (que o Bradesco chamou de “jatos”) do modelo ATR-72. 

Além da conectividade limitada e sem planos de expansão, a Passaredo ainda não re recuperou completamente do processo de recuperação judicial em que esteve por cinco anos. Apesar de o processo formal de recuperação já haver passado, as contas da empresa continuam apertadas.

Funcionários reportam, de tempos em tempos, atrasos no pagamento dos salários, de diárias, 13º e dívidas trabalhistas. O fluxo de caixa instável pode prejudicar também o pagamento de fornecedores. Apesar do seu passivo estar na casa dos milhões, o valuation feito pelo Bradesco foi de $93 milhões de dólares. Para se ter ideia, o leilão de apenas os slots da Avianca arrecadou $147 milhões e a empresa era 44x maior que a Passaredo. A própria Azul esse ano fez uma proposta de $145 milhões pela Avianca.

Em resumo, para adquirir o filé, a Azul teria que levar junto muito osso, com todo esse passivo, para ter um ganho que talvez não compense, então vemos tal notícia com muita parcimônia e entendemos que o caminho para a Azul ampliar operações em Congonhas não seria o take-over da Passaredo.

Entretanto, no mundo dos negócios tudo é possível, dependerá sempre do apetite de risco do capitalista.

Vale lembrar que em dezembro do ano passado, o BBI divulgou que a GOL seria a maior beneficiada com o fechamento da Avianca porque “cobria 80% das rotas da companhia” porém a foi bem rasa e se provou totalmente errada. O Itaú BBA também apontou para maior benefício para GOL e LATAM.

No entanto, segundo dados da ABEAR, não foi isso o que aconteceu. A Azul tinha, em dezembro de 2018, 18,8% de participação de mercado ante a 12% da Avianca e 38% da GOL. Os últimos dados, de maio de 2019, quando a Avianca já tinha praticamente deixado de operar, apontaram para a laranjinha mantendo 38% e a Azul indo para 25%.  Ao contrário do que o Bradesco projetou, até a Latam se beneficiou mais do que a GOL indo de 30% para 35% de participação.

O que o Bradesco desconsiderou em sua análise foi o perfil do público. A Avianca Brasil tinha a maior fatia do público mais premium, que preferia a companha por suas comodidades e conforto. A empresa mais próxima nesse quesito é a Azul.

Outro ponto é a conectividade, já que a Avianca Brasil era membro da Star Alliance. Enquanto Latam é oneworld e a Gol tem alguns poucos parceiros que são da Skyteam, a Azul tem acordos com players como TAP, United, Copa, Turkish Airlines, Lufthansa, Swiss e Air Canada, todas membros da Star.

Da próxima vez que você ver um relatório de um banco de investimento, desconfie. Junte mais informações. E, só depois, conclua.

Carlos Ferreira
Carlos Ferreira
Managing Director - MBA em Finanças pela FGV-SP, estudioso de temas relacionados com a aviação e marketing aeronáutico há duas décadas. Grande vivência internacional e larga experiência em Data Analytics.

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