Receita diz que Maranhão comete crime ao fretar avião ATR72, driblando o Governo Federal

Nos últimos dias o Governo do Maranhão tem noticiado que driblou governos ao fretar ATR para trazer cargas, mas acabou cometendo um crime, segundo a reação da Receita Federal do Brasil.

ATR Maranhão

O governador Flávio Dino (PCdoB) tem noticiado que conseguiu driblar os governos europeus, americanos e o Governo Federal do Brasil ao encomendar uma carga “diretamente da China”. Apesar de algumas mídias terem noticiado que o avião veio da China direto para o Maranhão com escala apenas na Etiópia, o próprio governo falou sobre o trajeto.

Um Boeing 777F cargueiro da Ethiopian Airlines, um dos vários que têm visitado o Brasil nos últimos dias trazendo toneladas de equipamento médico, trouxe a carga comprada pelo estado, com frete aos custos da Vale.

A aeronave fez o trajeto Shangai – Adis Abeba – São Paulo/Guarulhos. Na capital paulista a carga foi transferida para um ATR 72-600 da Azul Linhas Aéreas, que tem a capacidade de retirar os assentos para levar carga, e então voou sem escalas até São Luís, onde a carga de respiradores foi recebida pelo governo local que, prontamente, espalhou uma notícia sobre como “driblou” os EUA, Europa e o Governo do Brasil, se gabando do fato.

Contudo, a história contada pelo governo do estado não parecia muito “certa” desde o início, por diversos motivos, segundo aponta a Receita Federal.

Rota feita pela carga comprada pelo Governo do Maranhão © Great Circle Mapper

Inicialmente Flávio Dino alegava que a primeira tentativa de compra direta da China foi “interceptada” nos EUA. Como falamos anteriormente, nos EUA está vigorando o Defense Production Act (DPA), que obriga por lei (criada à luz da Segunda Guerra) que todos os recursos produzidos em território nacional ou por empresas americanas sejam oferecidos primeiro ao governo local, que pagará a vista o valor de mercado.

Logo, empresas americanas com fábricas na China tiveram que destinar sua produção para os EUA, assim como os chineses, por decisão própria começaram a vender para o governo americano que ofereceu melhor preço, quebrando contratos quando as cargas já estavam em trânsito.

Porém, se a carga não é produzida por empresa americana ou revendida por chineses, ela é entregue normalmente em seu destino. Vide o Antonov An-124 que chegou a Brasília dias atrás, lotado de carga depois de passar por duas cidades dos EUA: Anchorage, no Alasca, e Miami, na Flórida.

Pois bem, na segunda tentativa, segundo o governo maranhense, a carga foi “interceptada” pela Alemanha que, na verdade, pagou um preço maior para os vendedores, os quais decidiram cancelar o contrato com o Brasil. Então, por último o governo tentou comprar os respiradores nacionalmente, de uma fábrica em Curitiba.

Mas também não foi possível. No Brasil, dada a situação de calamidade pública declarada pela União com aprovação do Congresso Nacional, pode se usar o poder de confisco com posterior pagamento da produção nacional, similar ao DPA dos EUA. Mas, acima de tudo, o fato mais relevante desta “driblada” alegada pelo governo do Maranhão é que a carga passou por dois aeroportos pertencentes à União que, caso quisesse, poderia ter confiscado a carga – seja em Guarulhos ou em São Luís.

Para que a carga não passasse pelo “radar” da União, o governo local não realizou o desembaraço aduaneiro e nem avisou a Anvisa que, portanto, não emitiu a licença para uso dos respiradores, conforme a sua competência. Por conta dessa “malandragem”, a Receita Federal e a Infraero registraram um Boletim de Ocorrência em São Luís, alegando infração similar ao crime de descaminho, que é quando produtos autorizados a entrar no Brasil não fazem o processo devido de nacionalização.

A RF informou que irá tomar as providências legais, vide o descumprimento à legislação aduaneira (art. 23 e art. 27 do DL 1455/76), com representação aos órgãos de persecução penal.

Normalmente, este tipo de infração / crime tem punição de recolhimento da mercadoria envolvida, mas a RF informou que não irá exercer esta punição “de modo a evitar que qualquer paciente possa ser prejudicado, sendo designado o representante do Estado como fiel depositário dessas mercadorias durante o procedimento fiscal.”

Outros governos como o de Minas Gerais e do Rio de Janeiro, conseguiram importar sem problemas equipamentos médicos, inclusive em voos fretados. O governador Flávio Dino se pronunciou em rede social sobre o assunto, confira abaixo:

A Receita emitiu a seguinte nota:

“1. A retirada dos equipamentos do recinto aeroportuário não observou os requisitos legais para o regular desembaraço aduaneiro, tendo sido sua remoção realizada sem o prévio licenciamento da Anvisa e sem autorização da Inspetoria Receita Federal em São Luís, órgão legalmente responsável por fiscalizar a importação das mercadorias.

2. A gravidade dos fatos levou a Infraero a registrar o Boletim de Ocorrência Policial Nº 7798/2020, registrado em 15/04/2020, às 12h 06min.

3. Nas últimas semanas, com base na Instrução Normativa RFB nº 1.927, de 17 de março de 2020, editada especialmente para agilizar o desembaraço de produtos utilizados no combate à emergência sanitária da Covid 19, inúmeras importações de produtos dessa natureza foram liberadas pela Receita Federal em tempos mínimos, conforme noticiado em diversos meios de comunicação, sem que tenha havido intercorrências que pudessem significar atraso em sua utilização efetiva no tratamento de saúde da população atingida.

4. Diante da situação de flagrante descumprimento à legislação aduaneira (art. 23 e art. 27 do DL 1455/76), aplicável no âmbito do comércio internacional, a Receita Federal tomará as providências legais cabíveis contra as pessoas físicas e jurídicas envolvidas, promovendo os competentes procedimentos fiscais, além de representação aos órgãos de persecução penal.

5. Os equipamentos continuarão sendo utilizados pelas unidades de saúde em que se encontram, de modo a evitar que qualquer paciente possa ser prejudicado, sendo designado representante do Estado como fiel depositário dessas mercadorias durante o procedimento fiscal“.

A Azul Linhas Aéreas e a Ethiopian Airlines não se pronunciaram até o momento, no entanto, elas foram apenas contratadas para o transporte e não tem relação ao que foi feito pelos governantes.

Com informações da Assessoria de Imprensa da Receita Federal

Carlos Martins
Carlos Martins
Fascinado por aviões desde 1999, se formou em Aeronáutica estudando na Cal State Long Beach e Western Michigan University. #GoBroncos #GoBeach #2A

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