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Por que os novos Boeings 767 da FedEx não vêm com winglets?

Os winglets são uma modificação pequena, mas que traz grandes benefícios para os aviões. Então, por que a FedEx não os coloca nos seus novos Boeings 767?

Boeings 767 FedEx
Boeings 767 da FedEx em Los Angeles, Califórnia

Esta pergunta é recorrente de alguns leitores, e também era pessoal, já que tantas outras empresas aéreas colocam os winglets em seus jatos, mas a FedEx os recebe sem este adicional.

Os winglets são uma modificação na ponta das asas da aeronave, que reduz o arrasto induzido, ou seja, o arrasto causado pelo ar que escapa da parte de baixo da asa (onde há alta pressão) para a parte de cima (onde há baixa pressão). A economia de combustível pode chegar em até 7%, mas em média é de 4 a 5%, o que já é muito na aviação, como o Lito explicou bem:

De início, pensei que era uma questão apenas de custo na aquisição, já que economia parece não ser algo tão crítico no mercado de cargas aéreas quanto é no de passageiros: a prova é o próprio 767, que não é mais produzido para passageiros por existirem jatos mais modernos e econômicos como o 787 Dreamliner, mas ainda é para cargas.

Mas, conversando com alguns pilotos da UPS e também da Atlas Air (que também tem o 767 com e sem winglets, sendo todos os aviões adquiridos de segunda mão), descobri que é algo além de custo na aquisição do novo jato cargueiro.

Certificação

O winglet do 767 © Aviation Partners

A primeira questão é técnica: o 767 não foi desenhado com winglets, foi algo que surgiu depois do seu lançamento, assim como ocorreu com o seu irmão menor 757.

Anos depois surgiram os winglets, mas não feitos pela Boeing, e sim por uma empresa terceirizada. Neste caso, foi uma parceria entre a GKN Aerospace – que desenha e produz o winglet – com a Aviation Partners Boeing (APB), que é encarregada de instalar o componente e certificá-lo.

A APB é uma Joint-Venture da própria Boeing com a Aviation Partners, sua maior fornecedora de componentes estruturais, a qual a Boeing também é sócia. De qualquer maneira, o winglet não foi desenhado pela Boeing e não é instalado por ela.

Para esta modificação, foi feito um STC – Supplemental Type Certificate – uma alteração aprovada pelas agências aeronáuticas, no caso a FAA em 2008, para certificar o winglet para uso, numa encomenda para a American Airlines.

Logo, este design é patenteado e de uso exclusivo da APB, que ironicamente é localizada em Seattle, anexa à Boeing, mas continua sendo um projeto de uma empresa terceira.

Assim, durante a produção do 767 na Boeing, existe o custo financeiro e de tempo para instalar o winglet da APB, assim como fazer toda a papelada que um componente com STC exige quando colocado na aeronave.

Isto também traz a resposta para uma pergunta frequente no site: por que o KC-46 não tem winglets?!

Boeing KC-46. Imagem: Divulgação / Boeing.

O jato militar KC-46 é um 767-200ER modificado para reabastecimento militar e transporte tático. Mas, não existem Boeings 767-200ER com winglets, logo, colocar um winglet demandaria o projeto de um novo STC, novos manuais e novos documentos. Adicionalmente, projetos militares não possuem tanto foco em economia quanto projetos civis.

Assim, isso aumentaria o custo do já polêmico e problemático programa KC-X, em que a Força Aérea dos Estados Unidos, a USAF, escolheu o menor 767 ante o europeu Airbus A330 MRTT.

Espaço

Boeing 757-200 e dois McDonnell Douglas MD-11F da FedEx

Outro ponto comentado pelos pilotos é a questão de espaço ocupado pelo avião.

A FedEx, que é a maior cliente dos novos 767, é uma empresa que nasceu com pequenos jatinhos Dassault Falcon 20 cargueiros. Já sua concorrente UPS, apesar de ser uma centenária, só foi lançar nos anos 80 sua divisão cargueira, quando a FedEx já tinha se estabelecido no setor.

Assim, é necessário explicar a diferença das duas empresas, já que ambas recebem o jato sem winglets, mas a UPS tem colocado eles após um certo tempo (que tem sido de pouco mais de um ano após o recebimento).

Um dos motivos pelos quais a FedEx não segue o mesmo passo da UPS tem a ver com sua história: a empresa entrou no ramo de carga aérea antes, inicialmente com aviões menores como o acima citado jatinho Dassault Falcon 20, depois com os trijatos Boeing 727 e DC-10, além dos Airbus A310 e A300, este último ainda em operação.

Já a UPS tem operado o 767 desde 1995, além de ter começado sua história com o grande quadrijato DC-8. Assim, a FedEx usou por décadas todo seu espaçamento nos aeroportos para jatos com envergadura (comprimento de asa) menor, até adquirir o 767 apenas em 2011, enquanto a UPS sempre usou os de envergadura maior.

Mas o que os winglets têm a ver com isso? O 767 padrão tem 47,6 metros de envergadura, mas com a instalação dos winglets este número vai para 50,9 metros, um ganho de 3 metros e 30 centímetros, portanto, um espaço que a FedEx não queria perder nos seus aeroportos, como o abarrotado Memphis.

No final, acaba sendo tudo sobre custos

Boeing 727 da Western Michigan University que foi doado pela FedEx

Quando se fala em tamanho, vem, é claro, a pergunta: mas e o gigante 777F que a FedEx opera? Pois bem, o “Triple Seven” tem incríveis 60 metros de envergadura, mas faz parte de uma subfrota da companhia.

O objetivo do 777 na companhia é operar apenas em grandes aeroportos, levando cargas volumosas entre os hubs da empresa, substituindo apenas o MD-11F, que tem 51,97 metros de envergadura.

Enquanto isso, o 767 vai substituindo os A300, A310, MD-10 (DC-10) e uma parte dos MD-11F, tornando-se a espinha dorsal da companhia.

Alta demanda

E a demanda pelo 767 da empresa é tão grande que, mesmo com todos esses pontos descritos acima, ela tem usado um jato deste modelo com winglets. É o de matrícula N297FE, que pertencia à Silk Way do Azerbaijão. A empresa anterior colocou a modificação na asa, e ele depois foi incorporado pela FedEx.

Durante um breve período, houve ainda um segundo 767 com winglets, que é familiar dos brasileiros: foi o de matrícula N68079, ex-PR-ADY na ABSA Cargo, com a pintura da TAM Cargo num azul bem claro. Este “brasileiro” já retornou para a LATAM e hoje opera na nova identidade da companhia.

Como o winglet já estava instalado nestes dois 767, provavelmente não valia o custo para retirá-los na incorporação à frota da FedEx.

Por último, mas não menos importante, vem sempre o questionamento: realmente vale a pena não ter o winglet?

A resposta se relaciona à utilização dos jatos. A economia de 5% prometida pela Aviation Partners é alcançada, em sua maioria, em voos longos, em que há bastante tempo de voo com combustível sendo economizado. Em voos mais curtos, como ocorre com a maior parte da frota dos 767 da FedEx, o peso extra do componente não faz valer a pequena economia de consumo.

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