Veja o que causou a destruição do motor desse Boeing 777, segundo dados do relatório final

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Danos Motor Boeing 777 United Honolulu Falha Lâmina Fan
Imagem: Maria Falaschi

Em 13 de fevereiro de 2018, por volta das 12:00 horas, horário padrão do Havaí (HST), o voo 1175 da United Airlines, efetuado com o Boeing 777-222 de matrícula N773UA, sofreu uma separação de uma lâmina do fan, bem como perdeu partes da carenagem de entrada e do fan do Motor nº 2 (lado direito), um Pratt & Whitney (P&W) PW4077.

Agora, o Relatório Final emitido pelo National Transportation Safety Board (NTSB) dos Estados Unidos mostra quais foram as conclusões sobre o que levou à séria falha verificada.

Como tudo ocorreu

Enquanto o avião estava em voo de cruzeiro, nivelado no nível (FL) 360 sobre o Oceano Pacífico a caminho do Aeroporto Internacional Daniel K. Inoyue (HNL), Honolulu, Havaí, a tripulação ouviu um barulho alto que foi seguido por um tremor violento do avião e por avisos de uma parada do compressor do motor direito.

A tripulação desligou o motor, declarou uma emergência e seguiu para HNL sem mais incidentes. Não houve feridos entre os 374 passageiros e tripulantes a bordo e o avião sofreu pequenos danos.

Os pilotos relataram que, imediatamente após o estrondo, o piloto automático se desconectou e o avião começou a rolar para a direita. Uma troca de controles foi realizada com o comandante assumindo do primeiro-oficial os comandos do avião.

Os pilotos afirmaram que cerca de 15 a 30 segundos após o barulho alto, os instrumentos indicaram uma falha no motor número 2. Depois de cumprir a lista de verificação de Danos Graves no Motor, a tripulação desligou o motor. Um terceiro piloto que estava no assento adicional (jump seat) afirmou que, depois que o motor foi desligado, a vibração diminuiu, embora a controlabilidade do avião não fosse normal.

Enquanto a tripulação declarou a emergência e começou a descer ao FL 230, o comandante instruiu o piloto do jump a ir à cabine de passageiros para avaliar as condições do motor. Ele então observou que o motor estava oscilando e que a carenagem estava ausente. Ele gravou um vídeo do motor para mostrar ao comandante e ao primeiro oficial com o que eles estavam lidando.

Os pilotos relataram que, ao mesmo tempo, a comissária-chefe havia chegado à cabine de comando e o comandante informou-a sobre a emergência e que eles pousariam em HNL. O avião continuou até HNL, fez uma aproximação visual e aterrissou na pista 8R sem mais incidentes.

Danos à aeronave

A lâmina de posição n° 11 do fan do motor foi fraturada transversalmente a seu perfil aerodinâmico, diretamente acima das carenagens que ficam entre a base de cada lâmina.

Um pedaço dessa lâmina do fan ficou preso nos bordos de ataque das palhetas-guias de saída do fan. Esse pedaço de lâmina tinha cerca de 15 polegadas (38,1 cm) de largura em termos de sua corda, 23 polegadas (58,4 cm) de comprimento radialmente e tinha uma superfície de fratura na extremidade interna que correspondia à superfície de fratura no que restou da lâmina n° 11 presa no fan.

O exame metalúrgico revelou uma fratura por fadiga, de origem de subsuperfície. O exame também revelou que o material da lâmina do fan estava em conformidade com os requisitos especificados da liga de titânio. A lâmina nº 10 também se rompeu, porém, apenas por consequência do impacto da outra lâmina.

Houve danos extensos na superfície interior da caixa do fan na forma de sulcos e rachaduras. Embora houvesse rachaduras na caixa e a camada externa do envoltório de Kevlar estivesse dividida, não havia penetração de detritos. A localização da deformação máxima do envoltório foi coincidente com a rachadura no interior da caixa do fan, mostrando que o Kevlar resistiu corretamente à ejeção de material com alta energia.

Já da região de entrada do motor, de compósito de fibra de carbono (CFRP), a maioria das peças estava ausente (duto de entrada e carenagens do fan) mostrando que o material não resistiu à destruição causada pela lâmina fraturada. As partes ausentes foram perdidas no mar.

Por conta da estrutura de alumínio, testada durante a certificação do motor, ter capacidade para se deformar enquanto absorve a mesma quantidade de energia de uma estrutura rígida de CFRP, ela poderia redistribuir as cargas de uma ejeção de lâmina do fan (FBO) e resistir enquanto a lâmina atravessa a caixa do fan e a entrada do motor, sem causar falha completa. Mas o CFRP era o material usado nessa região de entrada do motor.

As análises estruturais de carenagem de entrada e da caixa do fan mostraram que o design da barreira de CFRP era menos capaz que a barreira de alumínio, o que levou à destruição das carenagens e a ejeção de fragmentos em direção a outras partes da aeronave.

Danos Motor Boeing 777 United Honolulu Falha Lâmina Fan
Imagem: Maria Falaschi

Havia dois pequenos amassados e perfurações no lado direito da fuselagem, abaixo da janela nas proximidades das fileiras 20 e 21 de assentos. O exame laboratorial da chapa ao redor da perfuração encontrou partículas embutidas, em grande parte de titânio e vanádio, que, junto com o alumínio, são os elementos de liga do material da lâmina do fan. A porta principal direita do trem de pouso, partes da asa direita e o estabilizador horizontal direito exibiam pequenos amassados e arranhões.

O exame laboratorial da lâmina nº 11 do fan revelou uma fratura por fadiga de baixo ciclo (LCF) que se originou na parede da cavidade interna diretamente abaixo da superfície. Todo o conjunto de lâminas do fan foi revisado pela última vez pelas instalações da P&W Overhaul & Repair (O&R) em julho de 2015. Como parte do processo de revisão, as lâminas foram submetidas a uma inspeção penetrante fluorescente (FPI) e a uma inspeção acústica térmica de imagem (TAI).

Os registros para a inspeção do TAI em julho de 2015, bem como um TAI anterior realizado em março de 2010, revelaram uma indicação térmica no mesmo local em que ocorreu a fratura LCF. Os registros da inspeção TAI de julho de 2015 da lâmina fraturada foram anotados como ‘pintura’ que, segundo o inspetor, era consistente com ele aceitar a indicação, porque achava que era um problema com a pintura da lâmina.

O processo de inspeção da P&W

A P&W desenvolveu o processo de inspeção TAI por volta de 2005 para poder inspecionar as superfícies internas da lâmina do fan de núcleo oco. A P&W, de acordo com a prática do setor de inspeção não destrutiva (NDI) ao implementar um novo processo de inspeção, classificou o TAI como uma tecnologia nova e emergente e, portanto, não precisou desenvolver um programa formal para treinamento inicial e recorrente, certificar os inspetores de TAI ou ter um inspetor de nível 3, como é feito em outras técnicas estabelecidas de NDI.

Mas em 2015, e ainda em 2018 quando o incidente ocorreu, a P&W ainda classificava o TAI como uma tecnologia nova e emergente depois de inspecionar mais de 9.000 lâminas do fan. Em um momento, a P&W até forneceu treinamento de TAI, no entanto, nenhum dos dois inspetores relacionados ao histórico de avaliações da lâmina fraturada teve permissão para participar do treinamento, para que eles pudessem usar o tempo para trabalhar na limpeza um conjunto reserva de lâminas do estoque da P&W.

O inspetor de TAI que trabalhou na última inspeção da lâmina do fan do incidente afirmou que nunca recebeu nenhum feedback dos engenheiros sobre as lâminas que ele havia reprovado nos testes. Quando os inspetores rejeitavam uma lâmina, ela era enviada a um engenheiro para uma avaliação mais aprofundada. No entanto, eles nunca receberam nenhum feedback dos engenheiros se a rejeição era válida ou se era um falso positivo.

Depois que foi determinado que os dois TAIs anteriores da lâmina do fan fraturado mostravam indicações térmicas no local da trinca por fadiga, a P&W iniciou uma inspeção extra de todas as imagens digitais dos TAIs realizados nas lâminas dos fans PW4000 de 112 polegadas, o mesmo modelo de fan do incidente.

Causas prováveis e fatores contribuintes

O Conselho Nacional de Segurança em Transportes determina as causas prováveis desse incidente como sendo:

  • A fratura de uma lâmina de fan devido à classificação contínua da P&W do processo de inspeção TAI como uma tecnologia nova e emergente, que lhes permitiu continuar realizando a inspeção sem ter que desenvolver um programa formal e definido de treinamento inicial e recorrente ou um programa de certificação de inspetores.
  • A falta de treinamento resultou no inspetor fazendo uma avaliação incorreta de uma indicação, que resultou em uma lâmina com uma rachadura sendo devolvida ao serviço onde eventualmente se fraturou.

Contribuiu para a fratura da lâmina do fan:

  • A falta de feedback dos engenheiros de processo sobre as çâminas dos fans que os inspetores enviaram aos engenheiros de processo para avaliação das indicações que haviam encontrado.

Informações oficiais do NTSB

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Murilo Basseto
Murilo Bassetohttp://aeroin.net
Formado em Engenharia Mecânica e com Pós-Graduação em Engenharia de Manutenção Aeronáutica, possui mais de 6 anos de experiência na área controle técnico de manutenção aeronáutica.

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